segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

A CONFERÊNCIA DE BEZERRA DE MENEZES



Na primeira noite após o memorável Congresso Espírita Brasileiro (1), fomos convocados para ouvir a palavra sóbria e cândida do paladino da unificação, Bezerra de Menezes, em ativo núcleo de nosso plano destinado aos empreendimentos voltados para o Consolador.

Ainda invadidos pelos sentimentos sublimes despertados pelo inesquecível conclave ora encerrado na cidade de Goiânia, trazíamos nossa mente imersa em profundas meditações acerca do quanto a ser feito ante as perspectivas descerradas.
No momento azado, dirigimo-nos para o salão onde se daria o conclave. Chegamos minutos antes no intuito de rever companheiros queridos que labutavam em plagas distantes e que, a convite de Bezerra, mantiveram-se ali após o congresso exclusivamente para ouvir-lhe a palestra.
A lotação era para cinco mil participantes e não havia lugares desocupados. Eram os trabalhadores do evento ora realizado, militantes da Seara em outros continentes, poetas, educadores, seareiros dos primeiros tempos, personagens da história brasileira, enfim, grupo imenso; todos comprometidos com os destinos do Espiritismo. Representações de caravaneiros de todos os estados brasileiros e dos países participantes do magno evento também estavam presentes, além dos servidores anônimos que se prestaram aos mais variados serviços de amparo e defesa pelo bem da tarefa concluída no plano físico.
Seria impossível relacionar todos, mas com intuitos que atendem a nossas ponderações do momento destacamos a presença de Robert Owen (o filho), César Lombroso, Humberto Mariotti, Milton O'Relley, Anita Garibaldi, Helena Antipoff, Edgard Armond, Torteroli, Jean Baptiste Roustaing, Benedita Fernandes, Deolindo Amorim, Herculano Pires, Carlos Imbassahy, Freitas Nobre, Toulosse Lautrec, Tarsila do Amaral, Frederico Fígner, Cassimiro de Abreu, Olavo Bilac, Castro Alves, Antônio Wantuil de Freitas, Alziro Zarur, Rui Barbosa, Antônio Luiz Sayão, Antônio Olímpio Telles de Menezes, Cairbar Schutel.
Fomos chamados para o instante aguardado. Uma pequena e singela mesa com um belíssimo ornamento de flores embelezava o palco ao lado de potente aparelho sonoro dirigido ao grande público presente. Tudo guardando extrema simplicidade. Sem cerimônias e delongas, após oração comovida por parte de nosso condutor é passada a oportunidade ao imbatível “médico dos pobres”(2):
UM NOVO TEMPO PARA O MOVIMENTO ESPÍRITA
Irmãos, Jesus seja nossa inspiração e Kardec a luz de nossos raciocínios.
O cinqüentenário do acordo de unificação, o Pacto Áureo, ainda agora enaltecido pela comunidade espírita mundial, é vitória de incomensurável quilate espiritual para a glória do Espiritismo. Os esforços não foram em vão.
Passado o conclave nosso olhar se volta, mais que nunca, para o futuro.
Sem demérito de qualquer espécie a corações que têm feito o melhor que podem, os que aqui se encontram presentes conhecem de perto a extensão das necessidades com as quais estamos lidando.
E ainda agora, enquanto muitos se encontram inebriados com a nobre comemoração face às conquistas logradas em meio século de serviço austero, atentemos para o quanto nos falta caminhar, a fim de merecermos com justiça o título de Cristãos da nova era.
EVOLUÇÃO CRONOLÓGICA DAS IDÉIAS ESPÍRITAS
Desde as primeiras idéias para a formação das bases organizativas do movimento, são passados quase cem anos. O progresso é evidente.
Entretanto, não será demais e insano afirmar que, a despeito das conquistas, encontramo-nos na infância de nosso movimento libertador ante a envergadura da missão a nós confiada na humanidade.
A progressão do ideário espírita está em boas mãos e a Falange Verdade continua o programa com sucesso, não obstante os empecilhos que são variados.
Inteiremo-nos com acerto sobre o que o momento espera de todos e façamos o que for preciso, a fim de impedirmos o prolongamento da conveniência prejudicial ao prosseguimento de planos maiores.
Os primeiros setenta anos do Espiritismo constituíram o período da consagração das origens e das bases em que se assentam a Doutrina, que lhe conferiram legitimidade. Heróis da tenacidade e fibra moral, dispostos a imolar-se pela causa, venceram o preconceito do tempo e a pressão da inferioridade humana no resguardo e defesa da empreitada de Allan Kardec. O último lance que delimitou esse período foi o Congresso Internacional de Espiritismo realizado em Paris (3), onde o arauto do bem, Leon Dénis, suportou a lâmina sutil da mentira e consolidou o perfil definitivo do Espiritismo como Doutrina dos Espíritos, eximindo-a de desfigurações que em muito prejudicariam sua feição educativa e conscientizadora.
O segundo período de mais setenta anos, que coincide com o fechamento do século e do milênio, foi o tempo da proliferação. Uma idéia universal jamais poderia ficar confinada a grupos de estudo ou experimentos da fenomenologia mediúnica de materialização; fazia-se necessária a intensificação dos conhecimentos dentro de um crescimento ordenado e defensivo na elaboração de um perfil filosófico. Eis o mérito das entidades promotoras da unificação e da multiplicação de centros espíritas. Sob o regime de controle e zelo foram predicados os seus objetivos primaciais. A literatura subsidiária provocou o questionamento, a discussão, o estudo, e com isso o aprendizado dilatou-se.
A primeira etapa consagrou o Espiritismo como ideário do bem, atraindo a simpatia e superando o preconceito; a segunda ensejou a difusão. Penetramos agora o terceiro portal de mais setenta anos, etapa na qual pretende-se a maioridade das idéias espíritas
É necessário atestar a vitalidade dos postulados espiritistas como alavanca de transformações sociais e humanas. Sua influência na cultura, nas artes, na ciência, nas leis, na filosofia e na religião conduzirá as comunidades, que lhe absorverem os princípios, a novos rumos para o bem do homem através da mudança do próprio homem.
Esse novo tempo deverá, igualmente, conduzir a efeitos salutares a nossa coletividade espírita, criando entre nós, seus adeptos, o período da atitude. O velho discurso sem prática deverá ser substituído por efetiva renovação pela educação moral. É a etapa da fraternidade na qual a ética do amor será eleita como meta essencial, e a educação como o passo seguro na direção de nossas finalidades.
Jesus definiu seus discípulos por muito se amarem, o Espírito Verdade assinalou o “amai-vos e instrui-vos” como plataforma do verdadeiro espírita, e esses ensinos deverão constituir a base do programa transformador para nossas metas ante a era nova.
Assim como nas demais fases foram programadas reencarnações missionárias, a exemplo do que sucedeu no iniciar dos séculos XIX e XX, igualmente se apronta uma geração nova para os novéis ofícios da causa, dentre os quais muitos de vós aqui presentes estão esclarecidos sobre seu auspicioso retorno às fileiras do Consolador em missões de solidariedade e renovação, enquanto os que guardam maiores compromissos na vida extra-física estão conscientes dos desafios que a todos nos esperam.
Descrevamos algo de essencial acerca dessas batalhas que enfrentaremos, para não localizarmos o “joio” onde está o “trigo” e definirmos melhor as estratégias de ação.
NOSSO MAIOR INIMIGO: O ORGULHO
Afirmamos outrora que o serviço da unificação é urgente, porém, não apressado(4). Verificamos no tempo que alguns corações sinceros e leais, entretanto, sem larga vivência espiritual, inspirados em nossa fala, elegeram a lentidão em nome da prudência e a acomodação passou a chamar-se zelo, cadenciando o ritmo das realizações necessárias ao talante de propósitos personalistas na esfera das responsabilidades comunitárias. O receio da delegação, a pretexto de ordem e vigilância, escondeu propósitos hegemônicos em corações desavisados, conquanto amantes do Espiritismo. Em verdade, a tarefa é urgente, não apressada, mas exige ousadia e dinamismo sacrificial para encetar as mudanças imperiosas no atendimento dos reclames da hora presente, e o hábito de esperar a hora ideal converteu-se, muita vez, em medida emperrante.
Ninguém pode vendar os olhos a título de caridade, porque deliberadamente o apego institucional marcou esse segundo período de nossas lides, em muitas ocasiões, com enfermiças atitudes de desamor como forte influência atávica de milenares vivências. Isso era previsível e, por fim, repetimos velhos erros religiosos...
Honrar e respeitar os antepassados e a história não significa aboná-la de todo, embora os nossos sentimentos devam ser enobrecidos no perdão, no entendimento, na oração e no trabalho. Foi o melhor que conseguimos em se considerando as imperfeições que nos são peculiares.
Na seara espírita, que declara inspirar sua ação em Jesus, o Mestre operoso, e em Kardec, o infatigável trabalhador, não deve haver o pacto insensato com os privilégios e a representatividade improdutiva. Se o Senhor deixou definido que o maior seria quem se fizesse servo de todos (5), de igual forma a função das entidades doutrinárias, de qualquer âmbito, é servir e servir sempre, mais e mais, no atendimento das extensas necessidades a vencer nas lavouras doutrinárias, cumprindo o roteiro dos deveres de orientação e apoio sem jamais avocar para si direitos ilusórios no campo do poder.
Há de se ter em conta que nos referimos ao institucionalismo como grilhão pertinente a todos nós, sem jamais vinculá-lo a essa ou àquela entidade organizativa em particular, porque semelhante marca de nosso psiquismo, por muito tempo ainda, criará reflexos indesejáveis na obra do bem.
O institucionalismo é fruto da ação dos homens; ele em si não é o nosso adversário maior e sim os excessos que o tornam nocivo.
Nosso maior inimigo, de fato, é o orgulho em suas expressões inferiores de arrogância, inflexibilidade, perfeccionismo, autoritarismo, intolerância, preconceito e vaidade, seus frutos infelizes que, sem dúvida, insuflam a institucionalização perniciosa e incentivam o dogmatismo e a fé cega, adubando a hierarquização e o sectarismo.
Seus frutos geram sementes, e precisamos interromper essa semeadura do “joio” que sustenta a ilusão de trabalhadores desprevenidos e invigilantes.
Quando os homens forem bons farão boas instituições(6), asseverou o insigne apóstolo de Lyon, Allan Kardec.
Nossa luta deve ser íntima e não exterior, não contra organizações, mas contra nós mesmos quando em atitudes praticadas sob o manto da mentira que acostumamos a venerar em favor de vantagens pessoais.
Esses desvios perpetrados lembram os primeiros momentos do Evangelho sobre a Terra, quando teve circunscrito seu raio de ação ao Judaísmo dominante. Tal realidade levou o Mais Alto a chamar o espírito corajoso e nobre de Paulo de Tarso na ingente missão de servir para além dos muros institucionais da capital do religiosismo, e tornar universal a mensagem do Sábio Pastor.
Conclamamos novos apóstolos para a “gentilidade” nesse momento delicado de nossa seara, porque o orgulho humano reeditou, em larga amplitude, os ambientes estéreis à propagação dos ensinos do Senhor. Temos um novo centro de convergência estipulado pela egolatria humana, buscando fixar estacas demarcatórias injustas e dispensáveis para o futuro glorioso da religião cósmica da verdade e do amor.
Essa velha bagagem da alma tem solução. Melhorando os homens, melhoramos as instituições. Por isso, nossa meta prioritária jamais foi ou será incentivar dissidências a fim de comprovar a eficácia de alguma ideologia, porque, em verdade, todas cooperam para um destino comum no futuro.
Apenas não podemos mais adiar medidas, esperando que os homens acordem naturalmente para as realidades que os cercam, junto às perigosas investidas levadas a efeito pelos inimigos confessos do Evangelho do Cristo na humanidade, em ambos os planos da vida. A hora é de ação e campanha para chamar na Estrada de Damasco os que queiram suportar o sacrifício, a renúncia e a obstinação em nome de uma nobre causa que é libertar a mensagem de Jesus dos círculos impregnados de bazófia e fascinação, através de exemplos de vida e do serviço construtivo de uma mentalidade em plena identificação com a mensagem moral do Espiritismo Cristão.
A hora pede clareza e determinação para a segurança dos ideais.
Há um momento em que a atitude de amor pede a verdade a fim de escapar dos pântanos da omissão. Estamos nesse momento. As diretrizes do Espírito Verdade não pactuam com as conveniências, embora não incentive o desamor. Esse tempo é daqueles que souberem ser coerentes, sem que a coerência custe o preço da discórdia tempestuosa. O desagrado existirá, porque a verdade incomoda quem se acostumou aos caminhos largos. Estamos no tempo dos “caminhos estreitos”, e os que aceitarem perlustrá-lo não terão as coroas de glórias passageiras e nem a aclamação geral dos distraídos do caminho. Serão taxados de egoístas simplesmente por decidirem buscar a “contra-mão” das opiniões e a percorrer o caminho inverso das consagrações humanas. Entretanto, terão um “contrato de assistência” permanente e irrevogável para angariarem as condições justas ao desiderato. Contudo, justiça aqui não significa facilidades, mas ação mediadora da Divina Providência para o bom andamento dos labores encetados. Temos grupos dispostos a comprometer-se com os misteres da hora a custo de sacrifício; eles serão os apóstolos da “gentilidade” dos tempos modernos.
Respeitaremos em nome do amor a quantos ainda estagiam nas formalidades e convencionalismos. Firmaremos bases seguras fora dos limites da conveniência, para assegurar, aos mais novos que chegarão, a oportunidade de vislumbrarem horizontes que atendam as suas exigentes expectativas, com as quais renascerão no soerguimento desse período de moralização e atitude, nesse momento de Espiritismo por dentro e não fora de nossos corações.
Carecemos de um movimento espírita forte, marcado por uma cultura de raciocínios lógicos e coerentes, e por atitudes afinadas com a ética do amor.Temos sim um problema, temos um inimigo. Atitude, eis a questão. Más atitudes, eis nosso problema. Atitudes de orgulho, nosso maior inimigo.
NOSSA META ESSENCIAL: O AMOR
Para que não nos chafurdemos em análises míopes, torna-se prioritário definir nossa grande meta em auxílio aos que mourejam na coletividade doutrinária, para maximizarem seus esforços nas direções mais nobres e úteis aos deveres dessa nova etapa de maioridade espiritual.
A meta primordial é aprendermos a amarmo-nos uns aos outros, para que tudo o que for criado em nome da causa espírita reflita a essência do Espiritismo em nossas movimentações.
Nossa meta essencial é o amor, a atitude que reflete Deus em nós.
Meditemos na inolvidável pergunta do Mestre: Que galardão teremos em amar somente os que nos amam? (7)
A diversidade é uma realidade irremovível da Seara e seria utopia e inexperiência tratá-la como “joio”. Imprescindível propalar a idéia do ecumenismo afetivo entre os seareiros, para que a cultura da alteridade seja disseminada e praticada no respeito incondicional a todos os segmentos. A atitude de alteridade será o termômetro do progresso das idéias espíritas no movimento, será o “trigo” vicejante e plenificado na ética da fraternidade vivida. As instituições embebidas desse espírito promoverão o diálogo franco e transparente e construirão através das relações as transformações. O desafio está lançado.
Temos como certo que as barreiras de aproximação estão mais frágeis que se imagina em alguns setores, embora muitos apostem na impossibilidade de rompê-las. Falta habilidade para conduzir processos que desafiam a inteligência das direções segmentares, e, não propriamente, o desejo de efetivá-las. Precisaremos todos de muita humildade para construir um terreno neutro como frisou Kardec (8), e de muito amor para garantir perpetuidade às novas relações de pluralismo e convivência com as diferenças.
Voltemos a atenção para a influência dos exemplos cristãos que constituem referências decisivas para os que, legitimamente, anseiam empreender o discipulado com Jesus e Kardec. Apesar das lutas humanas, necessárias e naturais, não faltaram e não faltam as balizas na Seara para que os espíritas, dispostos ao desafio de superar a si mesmos, encontrem inspiração para travarem o bom combate em direção ao crescimento e à libertação. A jornada é árdua e o calvário é doloroso, por isso muitos preferem as poltronas macias de valores temporais nos regimes institucionais.
No entanto, a despeito da certeza que guardamos sobre a atitude de amor, devemos estar conscientes sobre as sendas a seguir, a fim de não permitirmos romantismo e ingenuidade num momento de lutas ingentes. Para isso, divulguemos a diretriz a tomar para que não aprisionemos tal meta nos sonhos fantasistas do menor esforço e das crenças improdutivas.
NOSSA DIRETRIZ INSUPERÁVEL: A RENOVAÇÃO DE ATITUDES
A renovação de atitudes na edificação de uma nova mentalidade solicita uma inevitável mudança cultural em nossos ambientes doutrinários. O repúdio ao debate e a aversão ao confronto de opiniões são expressões do institucionalismo que ainda estão presentes no psiquismo humano, muita vez realimentado por organismos e oradores respeitáveis.
Quando Jesus convocou seus discípulos ao serviço do amor “deu-lhes poder”, conforme assevera o texto de Mateus(9). Reeditar esse fato é fundamental, a fim de alcançarmos melhores condições morais ao movimento espírita. Conferir poder é propiciar respostas, caminhos, horizontes, alternativas pedagógicas para instrumentalizar e capacitar alguém para alguma coisa. O Mestre, como educador, após os ingentes deveres públicos do dia, recolhia-se em colóquios íntimos com os corações dos apóstolos, ampliava-lhes as perspectivas sobre os ensinos, dimensionava as realizações extra-físicas em torno dos feitos de todo o grupo, e respondia a questões símplices, porém, de rara profundidade moral. Era ali, naqueles momentos íntimos, que se efetivava o poder de percepção e o desenvolvimento das condições necessárias ao apostolado, porque havia debates sinceros e resolução de conflitos em clima pacífico, sob a tutela do Senhor.
Hoje, mais que nunca, precisamos repetir tal episódio e permitir o “espírito do Senhor” na contenção de nossos impulsos de desagregação e isolamento. É urgente trabalhar por uma cultura de trocas e crescimento grupal, habituando-se a ter nossas certezas abaladas pelo conflito e pela permuta, para que ampliemos a capacidade de enxergar com mais exatidão as questões que supomos terem sido esgotadas. Essa diretriz conduzirá os homens a uma maior possibilidade de diálogo e intercâmbio, fazendo-os perceber a inconveniência do isolamento em muros de pseudo-sabedoria ou nas masmorras do autoritarismo institucional, ditando normas e idéias em nome de uma verdade exclusivista. Daí a importância de incentivarmos os dirigentes ao contato sadio com a dinâmica operacional dos centros espíritas e dos diversos segmentos da Seara, estabelecendo contatos, atualizando conceitos, tirando dúvidas, agendando encontros, criando ensejos ecumênicos para servirem de exemplos aos menos afeiçoados ao hábito da complacência com a diversidade do entendimento.
A melhor instituição será a que mais expandir as condições para o amor.
O melhor homem será o que mais apresentar tenacidade em amar.
A melhor Casa será a que mais implementar o regime de amor em grupo, imprimindo a seus deveres um caráter educacional.
Os heróis da fibra moral estão despedindo-se da Terra, porque cumpriram seu ministério de amor. Agora é o tempo dos atos solidários pela união das forças, relembrando o calvário no qual Jesus despediu-se glorioso, conferindo a continuidade da obra a quantos partilharam Seu percurso Divino.
Melhoremos o homem, despreocupemos dos excessos de medidas quanto à renovação de modelos institucionais que, inevitavelmente, surgirão sem pressa. Urgente é nossa adesão consciente aos princípios éticos da mensagem de Jesus atualizada pelo Espiritismo, sem o qual os modelos organizativos, por mais ajustados, vão ruir improfícuos.
Carecemos estabelecer programas centrados em valores éticos ao lado das bases fundamentais já esquadrinhadas pelo estudo. Favorecer os trabalhadores e lideranças com melhores noções sobre “As Leis Morais”, contidas na terceira parte de “O Livro dos Espíritos”, e aprofundar o entendimento sobre o inesquecível e universal sermão do monte de Jesus, assim como o fez Allan Kardec em “O Evangelho Segundo Espiritismo”, construindo um programa eficiente de renovação moral baseado na sábia filosofia de Jesus.
O conhecimento das verdades espíritas, por si, levará a velhas mazelas do saber se não for acompanhado pela vivência.
O fascínio resultante dos princípios espíritas não ocorre em função de estar o homem diante de conhecimentos novos que o surpreendem, mas sim porque está retomando o contato com idéias que já fizeram parte de seu patrimônio cultural, as quais não teve ele a capacidade de utilizar para a transformação de si mesmo, submetendo-se às injunções das idéias pagãs e do rompimento com a ética do bem. Destarte, é preciso hoje conjugar esse conhecimento, que é milenar, com a moralização, pela educação.
O tão decantado processo educacional de si mesmo passa pela melhor compreensão do mundo moral e suas implicações, que resultarão em melhor auto-conhecimento, pois, o “conhecimento de si mesmo é a chave do progresso individual”.(10)
Esse investimento no homem é a nossa chance de subtrair a noção inferior, que tenta subjugar o Espiritismo a mera religião de formalidades atualizadas, e colocá-lo, onde deveria estar, no patamar de roteiro lúcido de educação integral da humanidade.
A diretriz insuperável de Jesus continua como roteiro de rara oportunidade. Precisamos “conferir poder”. Como amar o próximo? Como obter abnegação? Como treinar a alteridade? Comprometimento é difícil para quem? É possível desenvolver a indulgência? Como dialogar em climas adversos? Como dialogar? O que é solidariedade e parceria? Como conceber a unificação em tempos de pluralismo? Ela é viável? Como oferecer essas condições de “poder” aos novos servidores da causa cristã? Qual o poder de transformação estamos viabilizando a homens comuns que encontram esperanças e alento nos celeiros de paz da casa espírita? Que temos feito para que as direções abram-se ao espírito de simplicidade? Que propostas temos a apresentar para facilitar um tempo de aproximação pacífica entre as várias tendências da Seara? Por que é tão importante essa aproximação?
O Espírito Verdade legou-nos o inspirado roteiro no “amai-vos e instruí-vos”. Instrução e amor, conhecimento e dinamização ética.
Levantemos a bandeira da unificação ética em torno da qual ser-nos-á possível atrair pela ação, mais que pelo discurso, ensejando a formação de pólos de congraçamento ecumênico entre nós, os espíritas com diversidade de idéias, mas num único sentimento, o do amor exalando a fraternidade.
Tomemos como lema a tríade inspirada do Codificador “trabalho, solidariedade, tolerância” (11), e cerremos esforços na campanha para que essa indicativa torne-se o programa da Casa e do movimento espírita mundial.
O trabalho opera as mudanças pela força das circunstâncias, a tolerância cria o clima indispensável para torná-las possíveis e a solidariedade é a mola propulsora capaz de fazê-las acreditáveis.
De que nos valerá conhecer a imortalidade e viver intencionalmente o materialismo? Essa foi uma indagação levantada pelo Codificador com fito de chamar-nos a atenção para a essência ética do Espiritismo.(12)
Se Kardec assim indaga quanto ao Espiritismo, perguntamo-nos de que nos valerá o Evangelho sem a vivência? Por que chamar Jesus se não atentamos para Sua presença no desenvolvimento de relações eticamente ajustadas com Seus ensinos?
Enveredemos pela religião, pela filosofia ou pela ciência, estudemos o Espiritismo ou o Evangelho, adotemos essa ou aquela prática com a qual melhor nos afeiçoemos, criemos essa ou aquela entidade para servir a novas experiências, tudo isso pouco importa se não tivermos amor. Recordemos o apóstolo Paulo em sua belíssima poesia: “Ainda que eu falasse as línguas dos homens e dos anjos, e não tivesse caridade, seria como o metal que soa ou como o sino que tine”. (13)
NOSSO CAMINHO DE SOLUÇÃO: A EDUCAÇÃO
Qual a solução?
Mencionamos a meta prioritária, conhecemos a diretriz insuperável, mas todos sentimos um vácuo no coração quando pensamos nesse ideário maior confrontado com a realidade moral de nosso movimento bendito. O que fazer já sabemos. A indagação que agora toma-nos a mente é: como fazer?
A melhor campanha para a instauração de um novo tempo na Seara passa pela necessidade de melhoria das condições do centro espírita, que é a célula operadora do objetivo do Espiritismo. Lá sim se concretizam não só o conhecimento e o trabalho, mas a absorção das verdades no campo individual consentidas em colóquios íntimos e permanentes, que reproduzem os momentos de Jesus com seu colégio apostólico.
Por isso, temos que promover as Casas, de posto de socorro e alívio a núcleo de renovação social e humana, através do incentivo ao desenvolvimento de valores éticos e nobres capazes de gerar a transformação.
Para isso só há um caminho: a educação.
O núcleo espiritista deve sair do patamar de templo de crenças e assumir sua feição de escola capacitadora de virtudes e formação do homem de bem, independentemente de fazer ou não com que seus transeuntes se tornem espíritas e assumam designação religiosa formal.
Elaboremos um programa educacional centrado em valores humanos para dirigentes, trabalhadores, médiuns, pais, mães, jovens, velhos, e o apliquemos consentaneamente com as bases da Doutrina.
Saber viver e conviver serão as metas primaciais desse programa no desenvolvimento de habilidades e competências do espírito.
O que faremos para aprender a arte de amar? Como aprender a aprender? Como desenvolver afeto em grupo? Como “devolver visão a cegos, curar coxos e estropiados, limpar leprosos, expulsar demônios”?
Muitos adeptos conhecem a profundidade dos mecanismos desencarnatórios à luz dos princípios espíritas, entretanto, temos constatado quantos chegam por aqui em deploráveis condições por não se imunizarem contra os padrões morais infelizes e degeneradores.
A melhoria das possibilidades do centro espírita indiscutivelmente facilitará novos tempos para o pensamento espírita, haja vista que estaremos ali preparando o novo contingente de servidores da causa dentro de uma visão harmonizada com as implicações da hora presente. Dessa forma, estaremos retirando a Casa da feição de uma “ilha paradisíaca de espiritualidade”, projetando-a ao meio social e adestrando seus partícipes a superarem sua condição sem estabelecer uma realidade fictícia e onerosa, insufladora de conflitos e de medidas impositivas, longe das reais possibilidades de transformação que a criatura pode e precisa efetivar em si mesma.
Interagindo com o meio em permuta incessante de valores e experiências, o centro espírita sai da condição de um reduto isolado no cumprimento de sua missão, e passa a delinear a formação de uma rede de intercâmbios, fenômeno esse que vem abarcando a humanidade inteira sob a designação de globalização.
Contudo, a interação da casa doutrinária com o meio deve ser ativa a ponto de transformar-se em pólo irradiador de benesses a outras co-irmãs e, igualmente, para o agrupamento social no qual encontra-se inserida.
Por isso, mais uma vez torna-se imprescindível renovar conceitos e reciclar métodos, a fim de atingirmos os patamares de instituições multiplicadoras da mentalidade imortalista e fraternal.
Esse processo de interação social reclama posturas novas, dentre elas a de abrir canais de permanente relação inter-institucional, na qual o centro espírita catalise fulcros de cultura e modelos experimentais, transformando-se em ambiente de diálogo e convivência para dirigentes e trabalhadores de outros grupos afins, passando suas vivências e aperfeiçoando suas realizações ao tempo em que converte-se em pólo espontâneo da união entre co-idealistas, no regime do mais livre pluralismo de concepções acerca dos postulados espíritas.
Mais uma vez a visão futurista do Codificador, prenunciando esse tempo, levou-o a declarar: “esses grupos, correspondendo-se entre si, visitando-se, permutando observações, podem, desde já, formar o núcleo da grande família espírita, que um dia consorciará todas as opiniões e unirá os homens por um único sentimento: o da fraternidade, trazendo o cunho da caridade cristã”. (14)
A criação desses pólos são medidas salutares contra o isolacionismo e, pela sua característica essencial de fortalecimento de idéias, ensejam uma relação mais participativa, descentralizadora, operando entre os grupos a prática da solidariedade.
Incentivaremos não só a renovação cultural nas casas espíritas, mas também a estruturação das entidades específicas que, pela sua neutralidade institucional, obterão um trânsito mais intenso junto à seara na dinamização de um arejamento cultural, no atendimento das necessidades humanas que abarrotam em solicitações e demandas.
Há serviço intenso a realizar, e devemos ver com bons olhos a multiplicidade de funções e a diversificação de medidas em favor dos clamores da sociedade.
Os dirigentes, ricos de boa-vontade e espírito cooperativo, anseiam por novos horizontes, todavia, tem faltado quem se disponha a dividir vivências ou a edificar um ambiente que se constitua verdadeira oficina de idéias e diálogo para a criação de caminhos novos.
Serão esses pólos as cooperativas de afeto cristão que permitirão aos servidores e condutores das responsabilidades doutrinárias renovarem esperanças, quebrando os circuitos de rotina dentro do labirinto de obrigações a que se renderam no ramerrão do centro espírita. Serão pólos de arejamento e solidariedade mútua regidos por intenso e espontâneo desejo de somar que, em última análise, é a unificação no que de mais sublime exprime o sentido dessa palavra.
UM PROGRAMA RENOVADOR PARA O CENTRO ESPÍRITA
Estamos, portanto, meus irmãos e amigos do coração, instaurando o período da unificação ética, da maioridade das idéias espíritas através do melhor aproveitamento individual dos seareiros dispostos a mais amplos vôos de renúncia, sacrifício e amor à causa.
Assim, todos nós aqui hoje reunidos estamos convocados a cerrar esforços continuados ao programa renovador de nosso abençoado movimento espírita, com vistas a ampliar na humanidade a mensagem de esperança e libertação trazida por Jesus e explicada com lucidez pelo trabalho de Allan Kardec.
Estamos em campanha.
Campanha pela unificação com amor.
Campanha pela renovação das atitudes.
Temos um problema na Seara: as más atitudes.
Temos uma solução para a Seara: novas atitudes. Seja essa a nossa campanha no bem pelos tempos novos a que todos somos chamados.
Todos aqui, mormente os que se acostumaram à docilidade e ternura de meu coração, não se surpreendam com a franqueza de minhas palavras.
Estejam certos que o sentimento é o mesmo e sempre será.
A clareza e a definição de minha fala são em obediência incondicional e servil a ordens maiores que cumpro em nome do Espírito Verdade.
Sem perder a fraternidade, vós outros que têm o acesso livre pela palavra mediúnica, levai essa mensagem ao conhecimento de todos. Aqueles que hoje aqui se encontram temerosos ante as novas chances que logo envergarão na carne, levai convosco a esperança de que em plena infância serão bafejados pelas claridades desse momento de renovação, dentro e fora das movimentações espirituais a que se matricularão. Aqueles que servem a outras fileiras de obrigações junto à humanidade, cooperem com nosso ideal incentivando a superação dos preconceitos e abrindo picadas para a penetração das idéias espíritas frente à sociedade.
Enaltecendo a comemoração, da qual ainda agora quase todos aqui presentes tivemos a benção de acompanhar junto aos irmãos no Congresso Espírita Brasileiro, peçamos ao Senhor da Vida que fortaleça sempre os ideais em nosso coração, para que as medidas salvadoras representem mãos estendidas e guiadas pelo coração sempre pulsante no bem, em favor das lutas e do aprendizado daqueles que receberam de Deus a gloriosa oportunidade de regressarem à carne no torrão brasileiro, fruindo das benesses do Consolador Prometido. Amparemos nossa bendita Seara em seus novos dias, relembrando sempre a nossos tutelados a importância do amor.
Rememoremos como fonte inspiradora de nossa campanha a sublime e inesquecível fala de nosso Mestre: “Nisto todos conhecerão que sois meus discípulos, se vos amardes uns aos outros”. (15)
ENCONTROS INESQUECÍVEIS
Terminada a fala de nosso benfeitor Bezerra, estávamos todos como que hipnotizados pelo afeto e pela autoridade com que externava seus conceitos.
Dissera ele muito bem acerca da surpresa que, durante muitos trechos de sua alocução, tomou-nos de assalto graças à franqueza e clareza com que explanava suas idéias.
Ele fora claro e fraterno, sendo que estávamos habituados somente com sua paternal e ilimitada complacência para com a extensão de nossas necessidades.
Percebia-se durante sua apresentação que irradiações muito intensas vinham de esferas superiores, para nós ainda desconhecidas, deixando evidenciar que, além de sua grandeza espiritual peculiar, realmente ele cumpria a determinações excelsas frente aos assuntos dissertados.
Terminada a palestra, tivemos o ensejo de presenciar encontros inesquecíveis que merecem nossos registros, para que os corações na Terra meditem sobre as realidades impostas pela imortalidade na jornada dos antigos servidores da coletividade espírita.
Destacamos o abraço fraterno entre Torteroli e Bezerra que se olharam como irmãos queridos de longa caminhada; em canto discreto do salão, percebíamos um dos mais procurados para o abraço afetivo e a palavra amiga que era Jean Baptiste Roustaing, cercado por amigos da Itália e da França; em outra cena presenciamos amigos queridos vinculados às propostas do Pacto Áureo discutindo as graves medidas que os aguardavam: ali estavam Wantuil de Freitas, Manuel de Quintão, Armando de Oliveira Assis, Osvaldo de Mello, Djalma Montenegro Farias, Militão Pacheco e outros mais. Era indisfarçável o interesse de todos em fraternizar com os nomes que fizeram história no país como Rui Barbosa e Olavo Bilac, cercados por Freitas Nobre, Carlos Imbassahy e outros políticos e religiosos. Observávamos também as caravanas vindas de vários estados e países reunindo-se a esse ou àquele coração de seu interesse no campo do aprendizado, e no caso da Caravana Mineira, composta por um grupo valoroso de servidores, estava ao centro das considerações o nosso estimado Antônio Lima tecendo alvitres quanto ao futuro.
Para nós, porém, entre tantos encontros e reencontros, ficou gravado no coração o instante de abraçarmos o nosso benfeitor Bezerra.
Acompanhando-nos, discreta como de costume, a nossa Ermance Dufaux, que tem sido o coração de nossas movimentações espirituais.
Constatei surpreendido que os olhos de Bezerra dilataram-se com o aproximar de Ermance; ele, que sempre ensaiava um termo ou outro na sua costumeira ternura, emudeceu-se, pegou as mãos delicadas da nossa amiga, beijou-as e disse:
“Filha, suas mãos representam troféus luminosos da vitória do Espiritismo nascente, quando as cedeste para a sublime consecução de “O Livro dos Espíritos”, e se anseias por torná-las úteis novamente nos serviços do bem, providenciaremos rumos a teus inspirados desejos.”
Ermance enrubesceu e lacrimejou, porque o sentimento elevado de Bezerra lhe havia sondado as profundezas da alma, percebendo-lhe a súplica velada na intensa disposição de contribuir com os destinos novos da causa.
Ela, num ímpeto generoso, mas guardando a típica fleuma de uma dama francesa, osculou com um fraterno afago a cabeleira do paladino, e sem dizer uma só palavra abraçou-o incontinente, com efusivo amor.
Terminada a atividade, olhamos para o infinito no firmamento e ficamos a meditar longamente sobre o que nos aguardava no futuro...
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
(1) Realizado na cidade de Goiânia a 05 de outubro de 1999, em comemoração ao cinqüentenário do acordo de unificação, o Pacto Áureo.
(2) Nota da editora: o texto que segue é a descrição que o autor espiritual fez da palavra de Bezerra de Menezes.
(3) Congresso Internacional de Espiritismo em 1925 coordenado por Leon Dénis.
(4) Mensagem recebida pelo médium Francisco Cândido Xavier, na Comunhão Espírita Cristã, em 20 de abril de 1963, Uberaba - MG, publicada na revista Reformador de dezembro de 1975.
(5) Mateus, 20:26 a 27.
(6) Obras Póstumas, segunda parte, Credo Espírita, Preâmbulo.
(7) Mateus, 5:46.
(8) A Gênese, Allan Kardec, capítulo XVII, item 32.
(9) Mateus, 10:1.
(10) O Livro dos Espíritos, questão 919a.
(11) Obras Póstumas, biografia de Allan Kardec.
(12) O Livro dos Médiuns, item 350.
(13) I Coríntios, 13:1.
(14) O Livro dos Médiuns, item 334.
(15) João, 13:35.


Texto extraído do livro:

Seara Bendida (2000) - Espíritos diversos; Maria José S. Oliveira; Wanderley S. Oliveira
(Editora Dufaux)

quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

Ana Prado



Da esquerda para direita: 1) Srta. Antonina Prado (médium psicográfica); 2) Eurípedes Prado; 3) Senhora Prado (a médium); 4) Alice Prado; 5) Erastóstenes Prado.

ANA PRADO
 A GRANDE MÉDIUM DE EFEITOS FÍSICOS

A Grande médium de efeito físicos, Ana Prado desencarnou em 24 de abril de 1923 na cidade de Belém no estado do Pará.
A médium Ana Prado foi casada com Eurípedes Prado, um guarda-livros da firma Albuquerque & Cia., de Belém do Pará.
A senhora Ana Prado foi uma extraordinária médium que possibilitou a realização de não menos extraordinários fenômenos de materialização em Belém do Pará. As sessões aconteciam na residência da família, sendo a filha do casal, Antonina Prado, médium psicografa.
Pioneira da prática de efeitos físicos no país, Ana Prado foi uma das maiores colaboradoras do escritor espírita Raymundo Nogueira de Faria, para a preparação de sua obra "O Trabalho dos Mortos", publicada em 1921. A obra detalha os fenômenos de efeitos físicos de materialização dos espíritos nos quais Ana Prado era o agente mediúnico, sendo ilustrada por fotografias de autoria do maestro Ettore Bosio.
Durante os anos de 1918 e 1921, uma gama de surpreendentes fenômenos sacudiram o Brasil, e, especialmente, a cidade de Belém do Pará.
As primeiras manifestações tiveram lugar em 12 de junho de 1918. Num fenômeno de transporte, os Espíritos fizeram aparecer, sob pequena mesa situada na sala devidamente fechada, uma bela flor, que, de forma poética, simbolizava a avalanche de prodigiosas comprovações da imortalidade da alma que aquele pequeno grupo assistiria ao longo de três anos.
Muitas vezes, os Espíritos repetiram o transporte, de flores, que chegaram ao número de vinte numa só sessão. Porém, também as moldagens em parafina ali aconteceram, quando, em dada ocasião, um molde perfeito de mão humana com dedos curvados fora produzido, ostentando, ainda, um lido ramalhete de rosas.
Um dos feitos mediúnicos mais expressivos de Ana registrou-se em 28 de abril de 1921, quando o espírito de Rachel Figner se materializou na presença de seu pai, Frederico Figner, diretor da conceituada Casa Edison, no Rio de Janeiro. Além das fotografias das materializações, foram produzidas moldes em parafina de flores, mãos e pés materializados. O fenômeno teve ampla cobertura da imprensa regional à época, muito contribuindo para a divulgação do Espiritismo.
Ela apareceu, por primeira vez, no dia 2 de maio de 1921. Acompanhemos o registro do meu conterrâneo Carlos Bernardo Loureiro de tão importante episódio:
“... Surgiu, junto à cortina, uma jovem, com todas as aparências e gestos de Raquel a tal ponto que D. Ester, sua mãe, exclamou: ‘É Raquel!’. Os gestos eram absolutamente os da filha dos Figner, e mesmo o corpo, a forma “o vestidinho acima do tornozelo, de mangas curtas e um pouco decotado”. Apresentou-se, assim, diante dos assistentes na reunião de Ana Prado, e, muito especialmente, face a face com os seus pais.”
Foram, aqueles, momentos de grande contentamento para pai e mãe, e para esta em especial. Em uma das manifestações, Raquel pede à mãe que deixe de usar o luto, pois, como ela afirmara, era “muito feliz” em sua nova condição.
 “Os fenômenos que ocorreram em Belém, Pará, através da fantástica faculdade mediúnica de Ana Prado, ombreiam-se aos mais notáveis já obtidos em várias partes do mundo. Ana Prado, sem nenhum favor, integra a galeria dos grandes médiuns que contribuíram, com sofrimento e profundos desgostos, para o engrandecimento e consolidação da causa do Espírito, Senhor do Tempo e dos Elos Perdidos...”

MARIA MODESTO CRAVO


Antônio Lucena

 

Foi discípula de Eurípedes Barsanulfo, "O Apóstolo de Sacramento", e como tantas outras criaturas foi encaminhada ao trabalho de amparo e de regeneração, graças à sua mediunidade, realizando tarefas missionárias nos dois Planos de Vida, material e espiritual.
Maria Modesto Cravo nasceu na cidade de Uberaba (MG), no dia 16 de abril de 1899. Seus pais eram de formação católica e a encaminharam para esta religião. Consorciou-se, aos 17 anos com o Sr. Nestor Cravo, em 1916. No ano seguinte transferiram residência para Belo Horizonte, quando sentiu os primeiros fenômenos mediúnicos em forma de obsessão, trazendo grandes problemas e preocupações para a família. O esposo, a conselho médico, resolveu retornar a Uberaba. Seu pai, João Modesto, sugeriu que ela fosse levada a Sacramento para uma consulta com Eurípedes Barsanulfo.
Foi diagnosticado que o seu mal provinha de espíritos sofredores. Teria que ser submetida de imediato a um tratamento espiritual e físico. Seu organismo estava muito debilitado.
Com o tratamento de preces e passes, água fluidificada e a leitura de "O Evangelho Segundo o Espiritismo" em poucos dias Maria Modesto Cravo apresentava um quadro animador. Com Eurípedes, começou também o seu desenvolvimento mediúnico, sendo logo convocada a trabalhar na equipe de médiuns no serviço de curas, o que ela aceitou com muita humildade. Eurípedes a aconselhou a regressar a Uberaba, retomando sua vida no lar e colaborando com o Movimento Espírita.
Assim iniciou sua colaboração em uma Casa Espírita daquela cidade do Triângulo Mineiro assistindo aos necessitados de todas as maneiras. Em casa, discretamente começou a atender abnegado serviço de receituário, servindo de intermediária de médicos da Espiritualidade.
Em janeiro de 1919 foi fundado o "Pronto Socorro Bezerra de Menezes", na Rua Bernardo Guimarães, também em Uberaba, cujo prédio ainda hoje existe. Três vezes por semana havia uma reunião de desenvolvimento mediúnico, onde os Espíritos, através dela, e de outros médiuns, assistiam a diversos enfermos, com doutrinação de desencarnados autorizados a comunicação.
Até então ela era médium passista e de cura, com a imposição das mãos. Na inauguração do Centro Espírita de Uberaba, houve significativo fato: o desabrochar de suas faculdades psicofônicas. Na primeira comunicação o Espírito se identificou como Ismael. A Diretoria da Instituição zelosa, resolveu consultar a Federação Espírita Brasileira. A resposta foi positiva, e do próprio Ismael, confirmando a comunicação, para alegria de todos.
Depois se seguiram centenas de comunicações de Espíritos acrescentando detalhes de suas vidas, identificações que não deixavam qualquer dúvida.
Em 1922, no Centro Espírita de Uberaba iniciou-se a celebração do Natal dos Pobres. Milhares de crianças eram mimoseadas com brinquedos e guloseimas. O trabalho foi estendido aos cegos, aos hansenianos e aos presidiários e suas famílias.
Em virtude do grande número de obsidiados e de portadores de insanidade mental, surgiu a idéia de construção do Sanatório Espírita de Uberaba, que tem prestado serviços inestimáveis à comunidade de Uberaba e adjacências.
Sua inauguração foi no dia 31 de dezembro de 1934. O Pronto Socorro "Bezerra de Menezes" fundiu-se com o Sanatório unindo-se todos os seus trabalhadores.
Desde a fundação do Sanatório, Maria Modesto Cravo vinha se prontificando a intermediária aos trabalhos de cura, na doutrinação de espíritos sofredores ou marcando a presença dos Mentores Espirituais, que transmitiam instruções, conselhos e orientações. Nesse trabalho recebeu a ajuda do dedicado médico Dr. Ignácio Ferreira, outro companheiro de atividades missionárias em Uberaba.
Ela se dedicou também à evangelização das crianças e dos jovens, em todas as faixas etárias, muitos dos quais são seus seguidores na atualidade.
Em junho de 1964, a conselho médico, transferiu-se para Belo Horizonte, em tratamento de saúde. Dois meses depois agravou-se o seu estado geral e no dia 08 de agosto retornou à Espiritualidade. Sua obra, porém, continua propiciando os melhores frutos de uma vida inteiramente devotada ao bem.

domingo, 6 de fevereiro de 2011

Aparecida Conceição Ferreira



Entrevista por Ismael Gobi 
A cidade de Uberaba, além de sua beleza e prosperidade, abriga, em seu seio, importantes personagens do movimento espírita brasileiro. Uma delas, que trabalhou ao lado de Chico Xavier, é Dona Aparecida Conceição Ferreira, que se projetou nacionalmente pela

Fundação do "Hospital do Fogo Selvagem", especializado no tratamento dos portadores do "Pênfigo Foliáceo", uma doença cujos sintomas se assemelham a labaredas que percorrem o corpo e deixam na pele verdadeiras marcas de queimadura.

"Dona Cida" começou esse trabalho no ano de 1957, quando trabalhava como enfermeira no Isolamento da Santa Casa de Uberaba. Como o tratamento do Pênfigo era difícil e dispendioso, o hospital acabou por suprimi-lo. A abnegada servidora de Jesus não titubeou: levou os doentes para a sua própria casa.

Pedindo esmolas nas vias públicas e recorrendo aos meios de comunicação, sobretudo com a ajuda dos jornalistas Moacir Jorge e Saulo Gomes, este, através da extinta TV Tupi, e contando com o irrestrito apoio de Chico Xavier, Dona Cida ergueu o grande complexo hospitalar destinado ao tratamento da insidiosa enfermidade.

Depois, com a alteração dos estatutos surgiu o "Lar da Caridade", que chegou a abrigar mais de trezentos desamparados ao mesmo tempo.

Embora conhecesse Chico Xavier, e dele recebesse ajuda desde o início, tornou-se espírita somente em 1964. Foi o Chico quem a incentivou a fundar o Centro Espírita "Deus e Caridade", onde ele comparecia para transmitir passes e receber mensagens psicografadas, grande parte delas assinadas por Maria Dolores e Jesus Gonçalves.

Em visita à abençoada seareira, agraciada com o título de Cidadã Uberabense por seus méritos, a "Folha Espírita" dela obteve longa entrevista, da qual destaca alguns lances de sua maravilhosa existência.

As origens: "De acordo com os assentamentos nasci em Igarapava, Estado de São Paulo, filha de Maria Abadia de Almeida, às 4 horas da manhã, no dia 19 de maio de 1917. Meus avós maternos foram Manoel Inocêncio Ferreira e Joaquina Angélica de Jesus. Pelos registros tenho a idade de 82 anos, mas acredito que tenha 86. Nunca vi meu pai e fui criada por avô e tio. Casei-me em Igarapava, no dia 14 de junho de 1934, com Clarimundo Emidio Martins. Lá fiquei até a idade de 36 anos, onde tive meus cinco filhos. De Igarapava fui para Nova Ponte, onde exerci o magistério na zona rural."

Em Uberaba: "De Nova Ponte, vim para Uberaba, onde fiz de tudo para manter minha família. Até limpeza de cisternas, porque quando cheguei na chácara onde fui morar não havia o que comer. Então, saía limpando cisternas. Eu descia no fundo dos poços, e eles puxavam o barro. Depois, me dediquei à horta. Os médicos da Beneficência Portuguesa vinham comprar as verduras e com isso não precisava sair vendendo."

Enfermeira: "O dono da chácara foi candidato a Prefeito e perdeu a eleição. Dizia ele que gostava do meu trabalho, mas não daqueles que vinham à minha casa. Verdade seja dita, eu não trabalhei na campanha dele. E eu lhe falava: "Quem vem na minha casa é melhor que eu", e procurei um jeito de sair de lá. Foi uma cabeçada, sofri bastante. Certo dia, o Dr. Jorge me convidou para trabalhar no hospital. Relutei muito, porque o quadro que eu presenciei no Isolamento era terrível: doentes com tuberculose, tétano, febre amarela... Mas acabei aceitando porque a oferta ia subindo, subindo... Afinal, me oferecerem três mil e trezentos, enquanto meu marido ganhava cento e oitenta."

Problemas: "Eu trabalhava no hospital havia dois anos e alguns meses. Venceu o mandato daquela diretoria, e entrou outra. A eleição foi dia 4, e dia 6 eles tomaram posse. Os novos diretores parece que tinham alguma rixa com nosso médico, que era irmão do Pedro Aleixo e partidário da UDN. A turma que ganhou era do PTB. Falaram para mim: "Olha, hoje não tem almoço para os doentes, pode mandar todos pra casa". "Como?" , eu disse, "eles não têm dinheiro, estão ruins." "Ordem dada, ordem executada", replicaram. Ou seja, não havia apelação, os doentes estavam na rua."

Em busca de socorro: "Eu procurava consolar os doentes dizendo-lhes: "Não chorem, não, nós vamos fazer uma passeata e o povo vai nos ajudar" . Fui a uma rádio pediram-me para "refrescar a cabeça", noutra, a mesma coisa, no jornal, igual. Eu não sabia que estava brigando com a nata da cidade: Prefeito, Escola de Medicina, Saúde Pública. Me mandaram pra casa e fui muito triste, nervosa, matutando como fazer. Eram doze doentes. Fomos para minha casa."

Momento de decisão: "Em casa, um de meus filhos me disse: "A senhora escolhe, ou nós ou os doentes". Não vacilei e respondi: "Hoje, fico com os doentes, porque eles têm Deus e eu por eles, vocês estão crescidos e vão se virar". Chamei todos eles para dentro, e entraram chorando. E aí os vizinhos me davam um caixote; o outro, um colchão; outro uma tábua; e eu agasalhei os doze. Fui fazer o almoço, eram três ou quatro horas da tarde. A gente estava só com o café da manhã. Enquanto fazia comida, gritava para minhas filhas esquentarem água para eles tomarem banho na lata de querosene e assim permanecemos ali por dois dias."

Asilo São Vicente de Paulo: "No fim de dois dias, chegaram os diretores da Escola de Medicina e da Saúde Pública para ver as condições, que eram precárias. E aí arrumaram o Asilo São Vicente de Paulo, para que ficássemos dez dias porque, no final de dez dias, como prometiam, iriam arrumar alguma coisa melhor. Foram dez anos, nunca mais vi eles. Foi o tempo que eu levei para construir isso aqui, com a graça de Deus e a ajuda do povo."

Preconceitos: "Havia muito preconceito para com os doentes. Eu saía para pedir esmolas com três deles. Muita gente nos via e descia da calçada. Eu falava: "Não saiam não, porque se vocês saírem, apanham". Se nós entrávamos nos ônibus, o pessoal descia. Fomos pedir em uma casa daqui, cuja dona se dizia espírita e os meninos tocaram no portão. Antes que subíssemos, ela mandou passar álcool no portão para desinfetar. A doença do pênfigo é triste, é horrorosa, o doente na primeira fase é um pedaço de carne podre. E o povo tinha medo, porque ninguém conhecia, nós vencemos. Para fazer esta casa aqui foi uma luta, tantos foram os abaixo-assinados para que não fosse feita..."

Oito dias no xadrez: "Aqui não tem um grão de areia dado pela Prefeitura, nem pelo Estado ou a União. Foi o povo quem me ajudou. O pessoal espírita daqui fazia a campanha "Auta de Souza" e traziam as coisas para mim. Mas não dava para manter a casa, porque no final de um mês eu tinha trinta e cinco doentes. Fui para São Paulo e ficava no Viaduto do Chá, em frente da Light. Punha um lençol, as meninas segurando, e eu com um sino dizia: "Me dêem uma esmola pelo amor de Deus, para os doentes do Fogo Selvagem de Uberaba". E aí o povo ia jogando níqueis. Na época, foram dois vereadores daqui passear em São Paulo: um advogado e um médico. Achando que eu estava desmoralizando Uberaba, fizeram Ofícios para o Chateaubriand (*) e para a Delegacia. Fiquei oito dias no xadrez, até que uma advogada, Doutora Izolda, me tirou. Quem mandou ela me tirar, não sei até hoje, pois ela já morreu."

No Palácio dos Campos Elíseos com Scheilla: "Um dia, eu e o Lauro (*) estávamos andando na Avenida Rio Branco, nos Campos Elíseos, e eu o convidei para entrar. Atônito, ele disse: "Você está doida, nós estamos sujos, fedendo a suor, entrar aí no palácio do governador?". Mostrei as fotos dos doentes ao policial da portaria, ele ficou muito revoltado e me mandou segui-lo. ... Passamos por saguões, escadas e tapetes vermelhos. Dona Leonor (*) estava conversando com um senhor. Em outra poltrona, estava sentado Don Evaristo e na terceira, nós. Ela acabou de conversar com os dois, e chegou nossa vez. Quando ela ia fazer menção de se sentar eu disse: "A Scheilla quebrou um vidro de perfume". Entre nós e a Dona Leonor ficou igual neblina e aquele perfume sufocando. Precisamos procurar ar. Quando melhorou, ela perguntou o que queríamos e lhe disse que pedia ajuda para o Hospital do Pênfigo. Ela disse: "Eu não posso ajudar, porque a senhora mora em Minas, e eu sou de São Paulo". Mas acabou me dando uma máquina de costura, duas peças de cretone e dez contos. Mas fiquei pensando: "O Chico não está aqui, como é que veio aquele perfume?"

O primeiro passe: "No mesmo dia em que estivemos com Dona Leonor, à noite, eu e o Lauro fomos a um Centro Espírita, uma casa velha, com muita gente. Logo que começou, o presidente da mesa falou: "A pessoa do fogo selvagem que estiver aí faça o favor de se dirigir à mesa". Não fui. Quando acabaram os trabalhos, todos foram saindo, menos aqueles da mesa. O presidente tornou a falar sobre a pessoa do "Fogo Selvagem". Eu me apresentei, e ele pediu-me desculpas porque não sabia quem eu era e falou que o "Mentor da Casa" tinha dito que era para eu dar um passe na Presidente do Centro, que já fazia três meses estava entrevada. Eu nunca tinha dado passe, mas agüentei firme. Subimos aquela escada de madeira em caracol e lá chegamos. Ela se chamava Mafalda, uma portuguesa. Estava sob um cortinado "chic", a turma rodeou a cama dela, e me puseram frente-a-frente. Eu iniciei a oração, senti algo estranho e pensei: "Nossa Senhora, agora vai sair bobagens aqui". Dei o passe e fomos embora. Dizem que em três dias ela andou. Aí, eu falei: "Preciso ser Espírita, porque a coisa está me apertando. A comida, ganhamos do povo espírita, agora a Scheilla me deu essa permissão, esse passe". Dona Mafalda me ajudou muito, fazia bingos, rifas, jantares, até quando morreu de câncer."

Chico Xavier: "Tantos e tantos foram os episódios interessantes que pude vivenciar com Chico Xavier. Certa vez, eu estava fazendo campanha em São Paulo, a situação estava difícil, e aquele dia não estava bom para pedir esmolas. Estava na Avenida Paulista, em frente da Televisão, amargurada, fazendo minha oração, triste, porque não estava rendendo nada. De repente, eu olho e vejo o Chico na outra calçada. Até que eu procurasse um lugar para passar e ir de encontro com o Chico, cadê o Chico? Que Chico, nada... Mas, daquela hora em diante, as coisas melhoraram para mim, desci a Brigadeiro e fui para o Anhangabaú, e ali a mina nasceu...

Meu primeiro encontro com o Chico foi quando eu tinha uma doente muito obsediada; na época, eu dizia que ela estava doida. Fazia quinze dias que ela não dormia e nem deixava ninguém dormir. O Chico tinha acabado de chegar aqui. Um acadêmico de Medicina, Aldroaldo, me convidou para levar a doente ao Chico. Eu disse: "Sou católica, não queria ser espírita, porque tinha comigo que para servir a Deus não precisava mudar de seita, em qualquer delas se pode servir". Então, o Aldroaldo apareceu com uma "chimbica" junto com outro estudante. A doente queria saltar pela janela, a colocamos no meio. Chegamos lá no Chico, o quarto era pequeno e estava repleto de gente. O Chico estava de pé, escrevendo. Mas eu não vi o Chico, eu vi o Castro Alves. Nem me lembrei que Castro Alves tinha morrido. Falei: "Que Chico, que nada, é Castro Alves, com cabelo à " la garçon", grisalho". Por fim, eu disse: "Vamos embora, vamos embora". Na volta, a doente veio moderada, entrou dentro do carro sozinha e dormiu a noite toda..."

O Espiritismo: "Eu detestava o Espiritismo. Só a partir de 1964 é que me aproximei do Espiritismo, quando estava fazendo a campanha de tijolos para esta casa. Como já disse, fiquei pensando, não é possível, o povo faz campanhas de mantimentos e os trazem para mim, o povo me agrada, me dão dinheiro, a Scheilla me aparece em São Paulo. Naquela noite, eu não dormi, matutando: "Eu vou lá na mulher, nunca tinha dado passe na vida, me mandam dar passe, só virando espírita". E o Espiritismo não é brincadeira, é coisa muito séria, não se pode brincar com o Espiritismo. Às vezes, você vai em um Centro pensando que vai levar e você volta carregada. Eu não brinco".

Uma mensagem aos Espíritas: "Aos que buscam desenvolver algum trabalho, a minha mensagem é de que tenham muito amor, muita sinceridade e que façam as coisas para si e não para os outros verem. Porque a maioria faz as coisas para os outros verem. E não importa o que os outros falam, porque todas as pessoas que vão fazer a caridade levam o título de "ladrona". Meu título era de ladrona. Alguém foi perguntar para o Chico, porque todos diziam que eu estava roubando. Porque quando eu comprava um terreno, diziam: "Comprou mais um terreno para o filho". Comprava outro, era a mesma coisa. Então, o Chico disse àqueles que foram lhe falar: "Me digam onde ela roubou, que eu vou ajudar ela a roubar". A partir daí, o povo foi parando de falar que eu roubava."

(*) Lauro- (acompanhante de campanha); Leonor- (primeira dama, esposa do governador Ademar de Barros); Chateaubriand (jornalista Assis Chateaubriand).

Sobre a vida e obra de Aparecida Conceição Ferreira sugerimos a leitura do excelente livro: "Uma Vida de Amor e Caridade", de Izabel Bueno, Editora Espírita Cristã Fonte Viva, Belo Horizonte-MG.

PUBLICADA NA FOLHA ESPÍRITA, SÃO PAULO, SETEMBRO/99.


Dona Aparecida Conceição Ferreira, conhecida como dona Cida do Lar da Caridade - Hospital do Fogo Selvagem, antigo Hospital do Pênfigo. Dona Cida por mais de 50 anos cuidou dos doentes e também das crianças, estas sem a doença, com toda dedicação.
Quando era enfermeira em um Hospital de Uberaba, prestes a fechar, ela levou todos para sua casa. Ao chegar a família se assustou! O marido não aceitava, nem os filhos, daí disseram à ela: ” Ou nós ou eles” e dona Cida disse: ”Vocês já estão todos grandes e criados, eles não tem ninguém, eu fico com eles”. Foram embora de casa... mas depois voltaram, compreenderam a tarefa e passaram a ajudá-la.
Um espírito abnegado, sem dúvida. Disse-lhe Chico Xavier que ela estava tentando resgatar seus débitos porém sem sucesso, mas desta vez conseguiu reencarnando negra, pobre e cheia de filhos doentes para cuidar. Os insultos, preconceitos, descasos foram inúmeros. Também, em suas conversas, dizia que Chico Xavier havia lhe contado que ela viveu no tempo da fogueira, da inquisição, e aquelas pessoas também. Ela perguntou à ele: “Chico, o que eu era?” Ele respondeu: “Você, minha irmã, era a mandante”.
Não recordo de tantos outros trabalhadores da Seara do Cristo com este desprendimento. Com certeza existem, pois o trabalho não precisa ser com alarde, Jesus espera de nós apenas o trabalho de amor ao próximo. Naturalmente um se projeta mais que outro. Podemos citar, logo ali perto de Uberaba, Irmão Tadeu, da Casa do Caminho, em Araxá-MG. Tadeu, em visita recente a RBN, disse que foi visitá-la. As pessoas sempre diziam: “Tadeu, Dona Aparecida fala que o senhor é um brancão orgulhoso que nunca foi lá na casa dela”.
Após a desencarnação de Chico Xavier as doações diminuíram porque as caravanas aproveitavam a visita ao Grupo da Prece e passavam por lá deixando alimentos, produtos de higiene e limpeza. As doações em dinheiro serviam para pagamento de funcionários, contas de água, energia elétrica e telefone. Agora é preciso usar também a mesma verba para comprar alimentos, o que gera um gasto maior para a instituição.
Tantas histórias ela contava aos que visitavam o Hospital, alegrias, desapontamentos, dores do passado como o dia que foi presa em São Paulo, acusada de pedir dinheiro para si, que Uberaba já a ajudava. Ela sempre disse, que “não fosse o povo de São Paulo e outras cidades também, mas principalmente o povo de São Paulo, não teria chegado onde chegou”.
Esta era Dona Cida... que retornou à Grande Pátria amparada pelos mais abnegados irmãos espirituais.
Logo pela manhã do seu desencarne o médium Divaldo Pereira Franco disse: "Recebida com júbilos por verdadeira multidão capitaneada pelo apóstolo Chico Xavier, mais uma estrela retorna ao zimbório espiritual para iluminar a noite das almas errantes e sofredoras na Terra."

De: Jesus-Kardec e nós